PEC da Segurança: governo bate cabeça e Lewandowski encara 'luta solitária'
O governo tem batido cabeça para mobilizar a base e obter avanços na tramitação da PEC da Segurança Pública, encampada por Ricardo Lewandowski, ministro da Justiça e Segurança Pública. Em nota, a pasta nega que o governo tenha desistido da proposta.
O que aconteceu
Aprovação da PEC da Segurança Pública se tornou uma espécie de "luta solitária" de Lewandowski. Fontes afirmaram ao UOL que o governo considera "perdida" a batalha e que teria "largado mão" de mobilizar as bases para que a proposta seja aprovada.
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Tema tem sido debatido diretamente entre o ministro e o Palácio do Planalto. Uma crítica ouvida é que as discussões sobre a PEC têm envolvido somente a presidência da República e o ministro Lewandowski. Outros integrantes da pasta afirmam não estar envolvidos na articulação.
Membros do governo estão pessimistas sobre avanço da PEC nas comissões. Embora o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tenha manifestado apoio à proposta e pedido aos parlamentares para não levarem a discussão para o "terreno político-partidário", há uma avaliação de que a PEC enfrentará dificuldade diante da atual configuração das comissões de segurança da Câmara e do Senado.
Ministro Lewandowski enfrentou críticas na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) ao defender o texto diante de parlamentares. Após se debruçar sobre os principais eixos da proposta, o ministro enfrentou críticas da oposição —que voltou a utilizar o argumento de que o texto tiraria a autonomia dos governos e das polícias estaduais.
"Tom professoral" atribuído ao ministro tem afastado governadores, parlamentares e secretários. Na CCJ, deputados disseram que Lewandowski "não estava no STF" —em referência ao período em que ele atuou na Suprema Corte. Mas membros do governo afirmam que ele está "aberto" a conversas sobre a proposta.
Secretário da Segurança Pública do Distrito Federal, Sandro Avelar disse que "não é de cima para baixo" que as mudanças da PEC vão acontecer. Ele, que também é presidente do Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública (Consesp), disse que os secretários estão organizando um pacote de medidas infraconstitucionais complementares à PEC para serem apresentadas no Congresso.
Sem marca na segurança
Governo Lula não conseguiu imprimir marca na segurança pública. A diretora-executiva do Sou da Paz, Carolina Ricardo, diz que a PEC foi uma "derradeira" tentativa de deixar uma marca, mas não há um legado do governo neste campo. "Não acredito que a mudança legislativa seja a melhor estratégia com esse Congresso", diz. "Mas foi a escolha do governo e tem o mérito de conseguir pautar um pouco mais o debate."
Sem a PEC, ainda não há uma marca, diz o senador Fabiano Contarato (PT-ES). Segundo ele, o governo tem pela frente um desafio: correr contra o tempo para avançar com um texto "mais palatável". Diante dessas dificuldades, apostar em novos projetos, como o projeto de lei antimáfia, se torna mais "factível" e "razoável", segundo ele.
Contarato diz ainda que a preocupação maior é o tempo. "Temos recesso em junho e ano que vem é ano eleitoral. Isso envolve governadores e policiais, muitos com posicionamentos contrários", disse. "Nós, do campo progressista, não falamos sobre segurança pública, não debatemos esse assunto", afirma o senador.
"PEC não é bala de prata", diz presidente do Consesp. Sandro Avelar disse que a marca do governo é se abrir para o início das discussões, mas há "um esforço grande por parte dos governadores" para conter a criminalidade. "A proposta é o ponta pé para a discussão ser feita no Congresso, é a coluna vertebral ao redor da qual a gente tem que tratar das soluções infraconstitucionais".
Falta articulação política
Governo precisa se empenhar na articulação política, diz Contarato. O parlamentar acredita que deve haver uma mobilização mais constante e permanente. Para ele, o governo deve se articular com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre, e da Câmara, Hugo Motta. "Deve cobrar dos presidentes das casas que o apoio não seja só verbal, mas de sensibilizar a coalizão do governo para que o texto seja aprovado".
Dificilmente o governo vai conseguir mobilizar a base e fazer as negociações necessárias, avalia Carolina. "Existe grande pressão da oposição e, com exceção de alguns mais aguerridos, o governo não comparece com parlamentares da base aliada estendida". Segundo ela, o governo teria de colocar muita força política para obter avanço. "Não me parece que seja um desejo, um apetite do governo".
Deputado José Neto (PT-BA) diz que a mobilização deve começar em junho na Bahia. Segundo ele, uma audiência pública está prevista. "A ideia de integração da PEC é muito forte, não vai ser fácil, mas tem de ser feita com a sociedade", disse. "Em geral, é um calcanhar de Aquiles, mas vamos colocar os argumentos na mesa. Temos que despolitizar e tirar isso do [âmbito] dos governos".
Histórico de entraves
Em outubro do ano ado, o presidente Lula se reuniu com os governadores para discutir pela primeira vez a PEC da Segurança. Antes disso, em julho, ele havia declarado que os estados não dão conta sozinhos da segurança. "À época, não havia sido feita nenhuma costura e isso deu muita força aos questionamentos da oposição."
Governadores aram a criticar a PEC e acusar o governo de retirar a autonomia dos estados. Seis reuniões ocorreram entre equipes do governo e governadores para alinhar os ajustes no texto. "Mas a briga já estava comprada e isso deu munição para a oposição faturar. O governo saiu perdendo e teve que correr atrás", afirma Carolina.
Pouca costura com associações policiais e demora para o "ok final" da Casa Civil. "Devem ser construídas pelos operadores que estão nas pontas, as polícias civis e militares tem de ser ouvidas, elas que lidam com a criminalidade", afirmou o secretário de segurança do DF. Integrantes do governo disseram que a demora para o "ok final", sinalizando concordância com o texto por parte da Casa Civil, Rui Costa, também prejudicou o início das articulações.
Pessoas precisam de respostas concretas, avalia Carolina. "Não dá para pensar numa PEC enquanto as pessoas têm medo de sair às ruas". A diretora do Sou da Paz diz que o governo federal deveria ter pensado em programas "mais objetivos" para combater furto e roubo de segurança, crime organizado e aumentar a capacidade investigativa. Além disso, "mais costura política" teria sido fundamental para fazer frente a atual formação do Congresso.
Leia abaixo, na íntegra, o que diz o ministério
Diferentemente do que a reportagem insinua, o governo federal não desistiu da PEC da Segurança Pública. O texto está seguindo o fluxo normal de tramitação no Congresso Nacional, cuja primeira etapa é a votação de issibilidade pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados. Nesta fase, tem ocorrido uma série de audiências públicas sobre o tema. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, participou do debate com os parlamentares. Também foram ouvidos governadores e representantes de associações de profissionais de segurança pública.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio da Secretaria de Assuntos Legislativos, e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República têm acompanhado a tramitação de perto e participado de todas as discussões.