Na ONU, Bolsonaro se divide entre tentativa de mudar imagem internacional e acenos a eleitorado fiel

Presidente brasileiro irá aos EUA pela primeira vez desde que Trump deixou a Casa Branca e expectativa é de discurso mais moderado do que os dois anteriores na Assembleia Geral
Às vésperas de fazer seu terceiro discurso na Assembleia Geral da ONU, onde o mandatário do Brasil tradicionalmente abre os trabalhos do maior encontro de líderes do mundo, Bolsonaro chega a Nova York, nos Estados Unidos, com a missão de conciliar duas tarefas quase antagônicas.
Por um lado, segundo diagnóstico do Itamaraty, o Brasil precisa reverter uma crise de imagem internacional. Para isso, o presidente brasileiro teria que abordar exemplos de avanços ambientais em sua gestão, celebrar o aumento da taxa de vacinação e o recuo da pandemia entre os brasileiros, repetir o mantra da responsabilidade fiscal na economia e reafirmar o compromisso do Brasil com direitos humanos e valores democráticos.
Por outro, depois de atrair centenas de milhares de apoiadores às ruas no último sete de setembro e recuar de suas próprias palavras dois dias depois, Bolsonaro vê no evento espaço ideal para reafirmar valores caros à sua base eleitoral - e produzir conteúdo replicável por ela na internet. Um dos temas que ele garante que defenderá na ONU é a aprovação pelo Supremo Tribunal Federal do marco temporal - que limita a demarcação de terras indígenas aos territórios ocupados pelos grupos em 1988, assunto que entusiasma a fatia ruralista de seu eleitorado.
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"Na próxima terça-feira, estarei na ONU, participando no discurso inicial daquele evento. Podem ter certeza, lá teremos verdades, realidade do que é o nosso Brasil e do que nós representamos verdadeiramente para o mundo", afirmou o presidente em discurso em Minas Gerais na última sexta, 17.
A pouco mais de um ano da eleição que tem chamado a atenção de agentes políticos internacionais, como o ideólogo do trumpismo Steve Bannon ou expoentes da extrema direita alemã AfD, Bolsonaro pretende ainda usar o palco da ONU para se projetar como uma liderança da direita global. Ao ex-porta-voz de Trump, Jason Miller, Bolsonaro demonstrou intenção de fazer a defesa da liberdade de expressão dos conservadores, que ele vê como alvos de censura das grandes redes sociais por defender suas posições políticas.
"O discurso que veremos é o resultado da queda de braço entre a diplomacia tradicional do Itamaraty e a política externa bolsonarista", afirma o embaixador Paulo Roberto de Almeida.
Sem Trump, sem Ernesto, sem Olavo
Quando subiu ao palco da Assembleia Geral da ONU pela primeira vez, em 2019, Bolsonaro estava embalado pela chancela das urnas ao projeto de poder que ele pretendia apresentar ao mundo naquele discurso.
Na audiência, contava com a simpatia do líder mais poderoso do mundo, o então presidente americano Donald Trump.
Ao seu lado tinha o chanceler Ernesto Araújo, o assessor internacional Filipe Martins, além da presença de seu filho Eduardo Bolsonaro, todos seguidores das ideias do ideólogo de direita Olavo de Carvalho, então radicado nos EUA, que ainda dava o tom de boa parte das decisões da gestão.
O resultado foi um discurso que apresentava o Brasil como um país que "ressurge depois de estar à beira do socialismo", "ideologia" que teria se infiltrado "no terreno da cultura, da educação e da mídia, dominando meios de comunicação, universidades e escolas". Bolsonaro ainda atribuía os problemas ambientais do país a "queimadas praticadas por índios e populações locais" e a denúncias "fantasiosas e sensacionalistas" feitas pela imprensa e por lideranças indígenas "usadas como massa de manobra por governos estrangeiros".
"Em 2019, Bolsonaro converteu o discurso da ONU num momento simbólico de reafirmação do projeto bolso-olavista. Numa fala anti-diplomática, ele dava as bases populistas da sua narrativa. Agora, dada a mudança de contexto, ele terá que recalibrar a narrativa", avalia Guilherme Casarões, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas.
Dois anos mais tarde, quando subir à tribuna da ONU no próximo dia 21, Bolsonaro não contará com a presença de Trump. O atual ocupante da Casa Branca é o democrata Joe Biden, contra quem o presidente brasileiro torceu abertamente nas eleições de 2020. Também já não estão no poder outros líderes simpáticos ao bolsonarismo, como o ex-primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu ou mesmo o ex-presidente argentino Maurício Macri.
"Bolsonaro está muito mais isolado agora do que em 2019. Vai ter que moderar ao menos um pouco o que diz porque já não tem Trump pra servir como escudo. E deve ter poucos encontros bilaterais, porque os chefes de Estado estão cautelosos em se associar a ele. O que sobrou pra ele, o Victor Órban, da Hungria">var Collection = { "path" : "commons.uol.com.br/monaco/export/api.uol.com.br/collection/noticias/politica/data.json", "channel" : "politica", "central" : "noticias", "titulo" : "Política", "search" : {"tags":"28132"} };